sexta-feira, 29 de março de 2019

Sonhos Ou Programações para Meninas Crentes?

Que sonhos são semeados no coração e na mente das meninas assim que saem do útero das suas mães? 

Lembro-me com clareza e alguma nostalgia os finais dos dias, em que íamos cedo para a cama e ela sentava-se na cama a rezar, eu já deitada ao seu lado, sentia o seu calor e o seu cheiro, parece que ainda hoje os sinto e ouvia a ladainha das suas orações, esta imagem remete-me para um sentimento de conforto, de protecção e segurança inigualáveis em qualquer outro momento da minha vida. 


Íamos à missa ao domingo, depois tinha a catequese e à quarta feira ia com a minha avó para a igreja ajudar a compor as jarras com flores brancas na maioria, nos altares e foi aí que eu comecei a sentir uma certa cumplicidade e mesmo intimidade com Deus e com os santos. 


Na verdade, eu estava muito próxima dos santos da minha igreja, da sua santidade e isso conferia-me importância e bem-estar. Sim, eu também rezava com a minha avó. Ainda hoje me lembro dos meus pedidos que mentalmente fazia. 
Igreja de Ferragudo - Nossa Senhora Da Conceição

Estava apaixonada por um rapazito da minha idade, 6 anos, queria casar e ser feliz com ele. Curiosamente muitos anos depois vim a saber que ele tinha ido para padre, não sei se é verdade ou não, pois depois de vir para Almada, para casa dos meus pais, nunca mais soube nada sobre ele, ou pouca coisa, lembro-me de o ter visto uma vez em Ferragudo, já eu era casada com o pai do meu filho, sendo este já nascido!... 

Casar e ser feliz num romance com um homem. Que desejo era este aos 6 anos? Que modelo é este? Não sei, porque na altura nem televisão tinha e, portanto, seria um modelo veiculado de que forma e por quem? Não sabia muito bem ler, portanto nem nos “caprichos” apanhava o modelo!…Será inato? Esta ideia idealizada do príncipe encantado? Será que a minha avó me contava a história da bela adormecida que o príncipe vem salvar? Sim, poderia ser por aí!...mas duvido!... A minha avó era uma mulher crente, mas prática e não me lembro dela me contar histórias. Antes dos caprichos e das telenovelas tínhamos os contos de fada que nos moldavam a mente? sim poderá ter sido por aí, esse meu sonho de casar e ser feliz para sempre!... 

Tentando encontrar um entendimento, para a causa de uma menina de 6 anos já percepcionar o enamoramento por um menino da sua idade e projectar na mesmo esta idealização de vida a dois, sem ter ainda ter qualquer noção do que isso possa na realidade implicar. 

Nessa altura nem sonhava como se fazia bebés ou mesmo, não tenho memória de sentir qualquer tipo de desejo carnal. 

Passo a citar uma passagem do livro A discípula Amada de Esther de Boer, que nos pode explicar da razão de uma menina ter estes sonhos: 

Falando de Maria Madalena e das mulheres que seguiam Jesus, Orígenes referido por Esther de Boer no seu livro, Maria Madalena, a Discípula Amada, descreve Maria que Paulo menciona na Carta aos Romanos precisamente como mestra. 

Comenta ele assim a carta aos romanos: 

“Saudações Maria, que trabalhou muito por vós”. Ele (Paulo) ensina neste texto que as mulheres devem trabalhar pelas igrejas de Deus tanto como os homens. Porque elas trabalham quando ensinam as jovens a serem frugais, a amarem os seus maridos, a educarem os filhos, a serem reservadas e castas, a governarem as suas casas, a serem boas e submissas aos seus maridos, a exercerem a hospitalidade, a lavarem os pés aos santos e a porem em prática castamente todas as outras coisas escritas acerca dos deveres das mulheres (comentário sobre a carta aos Romanos,X,20). 
Pág. 103, Esther de Boer, Maria Madalena – A discípula Amada. 

Esta interpretação do que se entende por dever da mulher, depois da vinda de Cristo e da manipulação da sua doutrina pelo Cristianismo operacionalizada pela igreja Católica, vem passando de mulher para mulher ao longo de séculos e século, poderá ter repercussões nas meninas, que já nascem com essa grande mentira aculturada, inserida nas suas mentes, coração e atrevo-me mesmo a dizer, no seu ADN que instrumentaliza o seu quotidiano, as suas vidas e consequentemente toda a humanidade? 

Sim porque esta instrumentalização da mulher não é privilégio do cristianismo, ela é transversal, de forma mais ou menos evidente, a todas as religiões do mundo. 

Como nos vermos livres deste peso secular? desta brutal instrumentalização? sem nos perdermos, sem nos descontextualizarmos da nossa essência feminina primordial? Será possível recuperar peças de um puzzle todo ele cortado, recortado e bem escondido do consciente humano no mais profundo da sua existência terrena? 

A negação do espiritual e do feminino das sociedades humanas, faz com que esta procura ainda seja mais difícil e ou mesmo impossível de se fazer. 

Há um caminho repleto de barreiras, de ratoeiras e outro tipo de obstáculos vários, que nos impede de aceder à verdade do que é a existência da plenitude feminina unida ao princípio masculino esse também domesticado e treinado para afastar-se da feminilidade inerente a toda a existência humana e divina. 

Esta história de contos de fada de que vos falava é bem mais profunda e ancestral que as histórias da Bela adormecida e da Branca de Neve, ela remonta à felicidade primordial que nos foi passada, a de Adão e de Eva, que viviam felizes no paraíso, antes da Eva querer aceder à árvore da sabedoria. Mal sabia ela que a sabedoria de que tanto ansiava lhe iria ser negada por séculos e séculos de domínio falocrático, domínio esse, exercido pelo cristianismo que passou de perseguido a perseguidor e nessa perseguição feroz a tudo o que pudesse colocar em causa o seu poder divino, a Eva que queria aceder ao saber e à verdade, tratou de destruir, mentir, ludibriar, apagar, queimar. 

Que paradoxo têm elas que gerir na dualidade, entre o sonho e a realidade? 

Não fosse o Capitalismo financeiro e ainda hoje as sociedades cristãs seriam dominadas pela doutrina da igreja Católica e aí as mulheres, como na religião Islã, estariam ainda a serem apedrejadas e escravizadas pelos seus maridos, pais, irmãos, padres, monges, enfim, pelo poder masculino que domina em níveis com maior ou menor intensidade esta vida terrena. 

A frustração que estes sentimentos comportam no futuro é tremenda e certas mulheres, não suportam a realidade das relações. 
Ana Maria Ferreira Martins
Excerto do livro "Mulher Plena Num Mundo De Homens"



domingo, 10 de março de 2019

Como é ser mãe empregada e separada?

Ser mãe trabalhadora e separada

Aliada à necessidade de independência económica que é o garante da independência da mulher em relação ao homem em geral e ao pai, ao marido em particular, a mulher mãe aquando de uma separação matrimonial, vê-se nos nossos dias completamente armadilhada pelo poder patriarcal, nas suas velhas e novas formas de manifestação, na maior parte dos casos sem disso ter consciência. 

Por um lado, os dados estatísticos (para quem gosta de estatísticas) conferem que os salários das mulheres, mesmo em funções iguais são inferiores aos dos seus pares, homens. A subida na carreira para cargos de administração ou da presidência, são praticamente inacessíveis no privado e no público. Por outro lado, o tempo para cuidar e estar com os filhos é praticamente inexistente. Assim  está criada uma poderosa ratoeira. 

Para ficar com os filhos e ou filhas as mulheres tem que trabalhar, mas para trabalhar não podem ficar com os filhos e ou filhas!...

Nas situações que chegam ao conhecimento da ação social e dos serviços sociais das instituições que realizam intervenção social no terreno, é frequente a coexistência de dificuldades económicas, violência psicológica e física sobre a mãe que se quer separar do pai da criança.

A mãe é frequentemente, ou pelo menos mais do que o desejável, sendo a situação comprovada por, assistentes sociais, juízes e juízas, separada dos filhos e ou das filhas por insuficiência económica, por alegados problemas de saúde mental, devido a depressões ou outras consequências de vidas em comum pouco saudáveis, ou ainda, por  razões relacionadas com a impossibilidade de conciliar o tempo de trabalho remunerado, fora de casa, com a azáfama da vida familiar.

O quotidiano vivenciado pelas mães que se vêm a braços com uma separação do pai dos filhos e ou das filhas, o que de certa forma pode estar relacionado em parte, ao facto de a mulher funcionar dominantemente com o lado direito do cérebro, mais ligado ao emocional e intuitivo, por contraposição ao lado esquerdo, mais relacionado com a lógica e razão, leva a que a mulher viva esta separação com uma maior intensidade psicológica do que a generalidade dos homens, tornando-se tremendamente duro e sofrido para a mulher mãe, a gestão do quotidiano do trabalho, dos filhos e da agressividade latente, que na maior parte dos casos existe dentro das quatro paredes a que comummente se chama lar, quando se está num processo de ruptura familiar.

Sim, é fácil numa sociedade dominada pelos valores da lógica, da razão, do comprovado cientificamente, em detrimento das emoções, das sensações, das intuições e atrevo-me a falar de amor em sentido lato, declarar perante um tribunal que o pai corresponde de forma mais alinhada ao que a sociedade patriarcal estipulou como as condições necessárias ao crescimento saudável e do bem estar, de uma criança.

O drama que a mãe vive na separação é ainda mais acentuado quando o filho ou filha é ainda bebé, onde os laços entre a mãe e a criança são indubitavelmente mais fortes e imprescindíveis para o desenvolvimento dos seres humanos.

Assim, vezes demais a lei é aplicada de acordo com a proclamada igualdade entre homens e mulheres e corta a direito, prevalecendo nas decisões dos tribunais, variáveis alinhadas com o poder económico e com os comportamentos e valores dominantes: O racional, o lógico e o prático, deixando de lado as dimensões afectivas e emocionais.

Que ser humano, homem ou mulher preferiria o bem estar económico ao amor de sua mãe? A resposta é muito fácil quando dada com o coração, o problema é que ninguém nos ensinou a falar com o coração e por isso muitas das decisões não estão internamente alinhadas com a essência feminina.

Para pessoas equilibradas, onde o bom senso aliado ao facto de os filhos não servirem propósitos egóicos. Ricas e ou pobres, que se amam e portanto amam os seus filhos e suas filhas, estas situações limite não se colocam com estes contornos e portanto, o aqui expressado não os tem por referência.
AMFM

segunda-feira, 4 de março de 2019

A Nossa Mãe



A relação com a nossa mãe é internamente mal resolvida.



Mulheres divididas na sua essência pelo modelo patriarcal, ou se tornam mulheres revoltadas ou mulheres completamente aculturadas pelo modelo dominante que tendem a viver numa zona de conforto criada artificialmente para elas e ou por elas, perfeitamente enquadrada nas regras religiosas, culturais e nas espectativas masculinas para a sociedade em geral e para o feminino em particular.


As mães terrenas frustradas, as que sempre contestaram o poder do marido, do pai e também da mãe que compactuou com o poder patriarcal. Revoltadas, nunca fizeram as pazes com as suas mães e nunca em consciência entenderão o porquê!… Esta falta de consciência cria-lhes um inevitável e irremediável mal estar, que na maioria dos casos transportam consigo de vida em vida. Podemos mesmo falar de um feminino enclausurado.

Todas as mães terrenas têm um misto de amor e ódio pelas suas filhas e por si próprias. Amor porque são parte delas, vendo-se através das mesmas reflectidas num já velho e gasto espelho.

Ódio, porque não se conseguem libertar dos grilhões patriarcais e percebem que também as suas filhas não reúnem as forças necessárias para o fazer, apesar das modernidades apregoadas.

Ana Maria Ferreira Martins